Ronaldo Brito
			Situações transitivas
A obra de Franz Weissmann parte de uma premissa decididamente 
moderna, anti-substancialista: o espaço não é uma coisa, uma entidade, é uma 
construção humana. As figuras geométricas deixam de ser tomadas como formas 
puras, imanentes, para se apresentarem como elementos da atividade incessante de 
espacialização. Quer dizer, agentes efetivos de realização. Porque a escultura 
passa a assumir agora uma tarefa prática — demonstrar as diversas e 
surpreendentes transformações do cubo ou do retângulo, por exemplo, equivale a 
concretizar lugares. E a experiência fenomenológica, intelectual e sensitiva, do 
lugar ultrapassa o raciocínio matemático estrito. Muito além de torções 
geométricas paradoxais — abrindo o cubo, atravessando o retângulo, desdobrando 
imprevisivelmente a fita — a escultura constitui uma abertura positiva para o 
espaço, a sua conquista e potencialização máxima.
A singularidade da poética de Weissmann reside justamente na fusão de rigor e 
agilidade — as relações espaciais podem ser as mais exatas e precisas, porém 
eminentemente instáveis e passageiras; como a apontar um outro estágio, 
imediatamente posterior. De um modo desconcertante para os parâmetros vigentes, 
essas esculturas não radicam na terra e sim ao ar livre. Com sua mobilidade 
essencial, recusam o fechamento sobre si mesmas, a interiorização e a 
cristalização. Constatamos, portanto, que tais lugares rejeitam as noções 
tradicionais de contornos interiores ou limites exteriores. Apareceriam, assim, 
se for isto concebível, como lugares ativos. Melhor ainda, situações 
transitivas.
O móvel do trabalho seria produzir determinadas configurações que, reiterando 
características específicas, assinalassem contudo ás suas outras possibilidades, 
virtuais, quase iminentes. Ficamos naturalmente retidos pela órbita de atração 
de cada peça — com toda a sua força simbólica — e incitados a imaginar as outras 
combinações que parece anunciar. Isto é, uma vez satisfeitos, logo divididos. Ao 
atingir uma certa completude somos de pronto convocados para o futuro, para o 
projeto da existência, este que não conhece termo final. Ligeiras e densas, o 
que essas esculturas ensinam é a inexistência do lugar ideal: a essência é 
trânsito.
O poder de concretizar coincidiria, finalmente, na equação poética de Franz 
Weissmann, com o poder de liberarão possível é mais verdadeiro do que o fatual. 
Distantes estaríamos, com certeza, do construtivismo escolar e sua razão 
mecânica. O trabalho de arte nada tem a ver com uma somatória de combinações, 
qualquer súmula das variáveis geométricas. Ele é a força capaz de inventar e 
descobrir, captar e decidir, movimentos reveladores de espaço. Manobras, 
momentos enfim, que nos levariam a experimentá-lo não como uma simples 
totalidade extensiva mas como um Todo Intenso.
 
©Ronaldo Brito - Galeria, revista de arte, setembro 1987